"Tenho minha vida inteira conectada à música. Vi festivais na época, no nascimento de uma fase áurea da música brasileira – e também internacional - e todos os filmes com os grandes sucessos do momento, que fizeram história e aumentaram o poder industrial da música, de Beatles a Rita Pavone, tornando-se este grande instrumento de comunicação massiva, além da propriedade intrínseca, como fazer artístico.
Com 12 anos fui introduzido ao universo dos conceitos sonoros quando em 1973 a Elis Regina muda radicalmente seus vieses musicais (“Não foi minha música que mudou, fui eu que mudei” – Elis Regina no Programa Ensaio), Pink Floyd (Dark Side of the Moon), Genesis (Selling England by the Pound). Esta estrutura rompida, da visão infantil, mas devidamente alocada com meus estudos de piano – e a audição frequente de música – chega à dimensão psicológica do que é posto em letras e música e o que se contextualiza em massa sonora.
Conheci Ana Terra através de “Meu Menino”. Fiquei chapado com música e letra, esta mais especificamente, dentro de um painel que é obra prima, o Clube da Esquina 2. Foi minha proximidade definitiva ao autor e às grandezas psicológicas e força expressiva para a massa, nas primeiras palavras: “Se um dia você fôr embora, não pense em mim que não te quero meu, eu te quero teu”. Quem era aquela pessoa que trazia um rompimento com regras culturais tão sutis, como entender e aceitar que o ser amado é uma outra pessoa? Saí “perseguindo” Ana Terra como admirador atento. Para não sair citando todas as canções, resumo que vejo em Ana Terra o magnífico poder da alteridade, da generosidade, de uma amplitude de visão e capacidade de expressão que realmente não é comum, principalmente no universohiper-difícil da canção brasileira, onde as coisas devem “soar e falar” como se fossem somente festa e alegria, como se festa e alegria não tivesse sequer o que sentir. Esta é a grande compositora Ana Terra que mesmo dentro da indústria, com mais de duzentas canções gravadas nunca deixou de batalhar pela qualidade estética, a valorização humana, a preocupação com o respeito à canção e sua plateia, à qual sempre chamou para o melhor, nunca para algo vulgar. Em “Essa Mulher”, parceria com a Joyce, temos o imenso de sua aura, tocando o universo feminino de forma sensível, plenamente interpretado por “minha diva” Elis Regina – à qual faço um paralelo de mulheres de fibra e sensibilidade, como se a canção não pudesse ter sido feita e interpretada por outras...
Ana Terra tornou-se amiga virtual. Entrevistei-a e confirmei tantos outros lados. Ela é um furacão de sensibilidade e expressão e nada passa sem sua doce e consistente visão e tato. Em suas palavras nunca nega o suor, a dose de força cuidada para o que fala. E não bastando, também é uma das grandes lutadoras por causas sociais, mais ainda pelos direitos do autor – coisa que é desdenhada, como se o artista não fosse um trabalhador, e dos grandes, pois aloca-se direto no senso humano de forma ética, merecendo ser devidamente respeitada em todos os sentidos.
Ana Terra é natureza, nutre-se e alimenta o quê e a quem está perto.
Minha gratidão a ti, Ana Terra, por este espaço imenso que você, em sua diversidade ocupa em minha pessoa. Você dá dignidade ao material que mais prezo na vida e está sempre reformulando meus afetos."
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