sábado, 21 de fevereiro de 2015

ÁGUA

Caio dos céus
até virar as marés
eu vou virando emoções.
Vivo a fluir,
não tenho  forma nem cor
eu vou pra onde eu vim, meu amor.
Se me detém
eu sempre posso fugir
jorrando aos borbotões.
Sei dos confins
de tanta terra e raiz
que eu molhei e amei por aí,
do limo ao ipê.
Sou eu que uno os secos,
umedeço os seres,
desço aos lodaçais.
Misturo corpos, almas,
ergo os medos
ao prazer dos imortais.
No êxtase dos místicos,
nos líquidos dos sexos,
fluxo e refluxo, suor.
Todo parto é solidão,
lágrima d’Oxum,
gota a gota,
rio a rio,
é tão doce esse sal.
Ai de mim
carrego tanta dor
a dor dos ancestrais.
Só no fim meus filhos terão paz
assim tão lindos no ventre da mãe.
Odò Iyá
brincar de renascer,
flutuam no ar outra vez,
até se tornarem essa luz...
clarão de outra mãe que faz chover.


Do fogo nascer.
https://www.youtube.com/watch?v=p9UJjW4IpRA

quinta-feira, 12 de fevereiro de 2015

DE PERTO

O abraço forma um pequeno arco
quando alguém amado entra nesse espaço 
cada beijo dado tem o seu formato
e jamais será  igual  o mesmo ato

O que emana  tem a perfeição exata
numa configuração que sempre é única 
cada criação carrega sua aura
e por ser humana não será da máquina 

Quero ir só onde minha voz me leve
e a corda, o sopro, a percussão alcance
nada amplificando o som desse momento 
onde cada um nos ouça mais de perto

para cada artista ter a sua parte
para cada instante ter a sua graça 
que o meu sustento venha dessa arte
um teatro grego que eu sempre carregue 
                                          Ana Terra / 28 jan 2015


  

domingo, 8 de fevereiro de 2015

CARTA ABERTA a FRANCISCO BOSCO

Prezado Francisco Bosco
Presidente da FUNARTE-Fundação Nacional de Artes

Em primeiro lugar, parabéns pela indicação para presidir o órgão do Ministério da Cultura que abriga o CEMUS- Centro da Música. É do lugar de compositora e ativista em defesa do músico profissional que venho propor um início de discussão sobre medidas que poderiam instituir uma outra lógica de políticas públicas para o setor. Todos sabemos que o grande problema do artista é não ter um mercado de trabalho permanente. Milhões são as causas entre elas o jabá que impede o acesso da maioria aos meios de comunicação, mas isso é outra discussão. 

O que venho propor está ao seu alcance e do poder público tanto federal como estadual e municipal. Que tal pensarmos em  aplicar as verbas diretas e as que chegam a alguns por meio de editais, que beneficiam uma minoria, e pensarmos numa política que beneficiará o coletivo, a maioria. 

Seria investir nos aparelhos públicos que já existem, para criar um mercado para o artista autoprodutor (termo utilizado por Antônio Adolfo para substituir o desvirtuado "independente", movimento do qual foi precursor nos anos 1970.) Objetivamente seria reativar o circuito universitário (vide Sergio Ricardo) somando-se escolas públicas, centros culturais, emissoras de rádio e TVs públicas e comunitárias, etc.

O Estado entraria com a infra-estrutura: aparelhagem de som e luz, transporte, hospedagem, alimentação, divulgação, em parcerias com prefeituras e secretarias de cultura de todos os municípios e estados do país. E o artista com sua arte. Nada de cachês milionários, seria bilheteria mesmo, como era antigamente. Se os músicos profissionais (compositores, cantores, instrumentistas) de diversas linguagens, tiverem trabalho o ano inteiro circulando pelo país, poderão conquistar um público próprio e viver dignamente de seu ofício. E o público conheceria a beleza da música brasileira que é produzida em todas as regiões do país.

Seriam contempladas várias propostas oficializadas nos Fóruns e na Câmara Setorial da Música como por exemplo: Formação de Platéia, Circulação, Divulgação, Ampliação do Mercado de Trabalho, Diversidade, Democratização dos Meios de Comunicação. 

É um trabalho que só dará bons frutos com o tempo. Mas se você começar a semear agora, ficará para sempre em nossos corações e mentes como o jovem que possibilitou o pão de cada dia aos artistas brasileiros de todas as idades.

Atenciosamente 

Ana Terra-compositora/escritora
Niterói, 8 de fevereiro de 2015.

segunda-feira, 2 de fevereiro de 2015

Guardiã das Canções




Desde tempos imemoriais, a voz feminina transmite por tradição oral as canções que passam de geração em geração por meio dos acalantos, dos cantos de trabalho, das cerimônias sagradas, das profanas, na cozinha, no quarto e quando cantamos para o filho que ainda nem nasceu mas nos ouve quando afagamos o ventre. Este tema, surgido em conversa com o compositor, instrumentista e maestro Gibran Helayel, me inspirou para escrever a última letra feita para este projeto, musicada depois por ele, e que assim o batizou, por sintetizar o conceito de que eu precisava para nortear este trabalho.

Tudo aconteceu de forma um tanto mágica. Queria muito comemorar meus 40 anos de letrista profissional em 2015, mas não sabia muito bem de que forma, já que não sou cantora. Um músico e amigo em comum, o Fred Martins, me apresentou virtualmente à Susana Travassos e desde então foi nascendo não só uma parceria musical mas também existencial, como se essa menina tão linda e talentosa chegasse à minha vida para me presentear com sua voz e sensibilidade.

O Projeto de interpretar minhas canções  foi proposto por Susana a Paulinho Mendonça, diretor do CANAL BRASIL, que nos recebeu de braços abertos para gravar um Programa Especial, que se desdobrará em CD e DVD.

Somando Susana  minha parceira  em " Amor sem Calmaria", teremos no repertório seis mulheres compositoras que musicaram minhas letras desde o início da carreira e são fundamentais na minha trajetória, Joyce, Sueli Costa, Angela Rô Rô e Lucina. Além do milagre de letrar Chiquinha Gonzaga um século depois de sua composição instrumental. 

Dentre os parceiros homens estão Danilo Caymmi, com quem iniciei meu ofício, parcerias inéditas com figuras lendárias como Milton Nascimento, Sérgio  Ricardo, Francis Hime, Elton Medeiros, Roberto Menescal e Cristóvão Bastos, além da alegria de outros talentos mais jovens como Fred Martins, Eudes Fraga e Cláudio Nucci musicando minhas quadrinhas em homenagem à poeta portuguesa Florbela Espanca, assim como a recente e feliz parceria com o maestro Gibran.

foto Susana: Thaís Taverna / foto Ana: LC Varella
         
                             Ana Terra/2 de fevereiro 2015