quarta-feira, 27 de agosto de 2014

Sem Stella Maris.

Minha ex sogra e amiga da vida inteira. Uma força da natureza que cursou até o terceiro ano primário e tinha a inteligência intuitiva e emocional que muitos letrados não tem. Mesmo depois de separada de Danilo continuei a conviver com ela e Dorival em Copacabana  e nas férias em Rio das Ostras e São Pedro do Pequiri. Uma pessoa de mente aberta que sabia que os laços de afeto não se desfazem    com a mudança de estado civil.

Com ela aprendi  muitas coisas. Fazer moqueca, pescar, ajudar a quem precisa e mandar quem nos pertuba para a puta que o pariu. E também, o que ela pontuava como demonstração de fé ao seu orixá: Ogum é que sabe.

segunda-feira, 18 de agosto de 2014

VIRÁ


Virá o momento em que terei dúvidas 
mas elas serão apenas pássaros voando 
e eu o ar
atravessado por flechas que não me ferem mais
cumprem seu destino
de movimento e repouso

sexta-feira, 15 de agosto de 2014

MEU BEM - I

Não, meu bem. Eu cheguei tem muito tempo. Aquela que viu vestida de melindrosa era eu nos anos loucos bebendo champanhe e dançando charleston pra você, a hippie viajando de ácido e te mostrando a beleza de tudo que você não via, e aquela protegendo a cabeça dos meus e dos teus filhos, também era eu. Até a que desfilou no carnaval e tocou tamborim na roda de samba. Eu era tantas que você dormia e acordava com mulheres diferentes e não sabia que todas eram uma só. E agora pergunta quando cheguei? Eu não sou uma fantasia, eu sempre estive dentro de você.


MEU BEM - II

Sim, meu bem eu cheguei tem pouco tempo. Vim de longe, por ar e por terra, pelo caminho que não era uma linha reta, tinha muita curva, precipício, fera. Mas mesmo não sendo o mais perto, ainda cheguei a tempo de te salvar desse deserto. De trazer meus rios, cachoeiras , flores e um peito aberto, crivado de estrelas que apanhei no espaço, e teu nome tatuado no braço. Não ria quando eu choro, não briga quando eu erro, não suma quando espero. É muito pouco o que quero. Acabei de chegar mas não tenho pressa de me apresentar porque antes, bem antes de me conhecer você olhava o céu e me procurava. E porque eu estava a caminho, não me encontrava.




MEU BEM - III

Sim, meu bem, pode falar. Eu sempre te escuto mesmo estando em alto mar, ou no olho do furacão, nas asas de Pégasus ou na boca do vulcão. Pode sim, você sabe que manda em mim, mesmo quando eu digo que não, e a gente não sabe quem é mais mandão, se eu com minha calma ou você com sua aflição. Estou ouvindo, claro que entendo tudo o que diz ou cala, suas metáforas, enigmas , o que esconde ou fala, cabe a mim decifrá-las e assim te poupo das mentiras, das verdades, das falácias. Claro que sim, como não ia crer, que nos amaremos em todos os tempos e galáxias, e entre nós nunca haverá ninguém. Poetas não mentem, não é meu bem?


MEU BEM - IV

Não, meu bem, hoje eu não vou. Porque talvez o vento sudoeste seja um sinal para ficar onde estou. Com alguma certeza, não muita, com alguma beleza, não tanta. Porque nem todos os dias a musa canta. Às vezes emudece e é só silêncio. Ela sente quando seu peito bate por outra. E mesmo sendo forte como pedra, seu coração desmorona. E mesmo sendo clara como água ela se afoga. Mas não desiste das palavras mudas porque delas se alimenta. E talvez um dia lá no fundo do poço você entenda. Que o amor de sua musa não é fantasia, não é lenda. Com seus olhos de planeta ela espera. O dia que seu dono será dela.


MEU BEM - V

Claro, meu bem, sei que essa canção ele cantou pra mim. Mas o que pode ainda um passado desfeito, um plano mal traçado, uma fotografia sem cor? Mas a precisa nota, a fundamental palavra, no meu peito ainda toca. Nenhum homem passou por mim sem troca. A todos devo a dor e a delicia de ser o que sou, palavra por palavra estou aqui me entregando, voa ligeiro, leva essa carta para o meu amor, eu não me entrego não, eu criei coragem para seguir viagem, e todos os dias acordo com meu corpo marcado pelos homens que nele tocaram, uns me deixaram forte, outros me deixaram calma. Nenhum me fez mal, muitos fizeram bem, e alguns como você, tocaram também a minha alma.


MEU BEM - VI

Não, meu bem, você não me deve nada, de que espécie eu seria, se meu amor tivesse paga. Com que olhos dormiria o sonho de ser tua amada, que espécie de coração no meu peito bateria se antes não tinha nada.Nada de nada eu sentia e agora até minha mão por você é que se guia, de noite e durante o dia. Não se culpe, não duvida, antes em mim nada havia, hoje é você minha vida. Com dor, mas também alegria.



MEU BEM - VII

Sim, meu bem eu ainda escuto estrelas. As vezes são do mar e me cobrem de segredos, outras do espaço me ensinam a não ter medo, e eu te sigo pelas constelações das palavras que me envias como se fossem flores, todos os dias, como se fossem mel todas as vezes, como se fossem minhas e merecesse, prender as tuas em minhas redes. Eu ainda vejo teus olhos tristes  que se arremessam sobre meu peito, que escorregam pelo meu colo e grudam em mim como adereços. E por tanto te amar, eu agradeço.




MEU BEM - VIII

Pois é, meu bem, tenho o hábito de ter ideias minhas.  Sou aquela do século dezenove de jóias enfeitada, a que de amor tinha vertigem, desmaio e manifestos escrevia para o primeiro de maio, enquanto nosso enxoval bordava. A que pratica a cidadania engajada, que sabe que a revolução também é teórica, como o Cavaleiro da Esperança ensinava. 

Meu prazer vem do homem que amo, de ser tantas vem a minha alegria. Minha teologia é a da Libertação e meus Orixás são da Bahia.                                              

MEU BEM - IX

Não, meu bem, o prazer não mora num só lugar. Ali é apenas porta de saída, quando já estamos de partida, o corpo é uma vasta morada, casa de altos e baixos, vista para a avenida, para sol e mar, para o infinito. Cada canto tem seu segredo, memória, silêncio, grito. E mais que tudo tem o tempo. Travando fechadura, janela, trinco. Requer mãos de afeto, óleo especial, sorriso. O mesmo tempo que parece tanto, não fosse ele não haveria como, acumular tesouro, saber, encanto. 

E se a visita lembra, não só da embriagues na saída, mas de quanta festa foi ali vivida, a casa inteira brilha, de um prazer que nunca então sentira. 

MEU BEM - X

Será, meu bem, que você me duvida? Quando te amei, foi assim meio escondida na primeira vez, mas depois escancarei, só não viu quem não queria, foram raios e tempestades inteiras, para te iluminar e afogar sem pena, sem nenhum pingo de cuidado, isso é de homem, mulher joga pesado, quando quer um homem não receia, nem finge, incendeia. E você na sua caverna não viu nenhuma centelha? 

Não tenha medo, esse fogo não mata, é sagrado, da ordem dos milagres, e só uma forma santa, de dizer que alguém te ama.



MEU BEM - XI

Sabe, meu bem, que eu te amarei sempre? Nas alturas, nos dilúvios , nos mergulhos ao Hades, em tantas rodas da fortuna cabes, que mil homens deixarei passar, e permanecerás, colado aos meus poros, morando em meus suspiros, surgindo em meus espelhos. 

Em que régua medirás nosso afeto, de que ordem será teu desejo, de que jeito ficarás sem meus beijos. Em que universo há valores findáveis, em que tempo estiveste ausente, se de mim nunca ausentaste.
                                                                      

MEU BEM - XII

Sabe, meu bem? Inventei uma persona para seduzir seu macho mais primitivo, o civilizado já é por demais seduzido. E de um acordo implícito, sem nenhum decoro, nasceu essa cumplicidade básica . Ando tocando em transparências como se o mundo não me aprisionasse mais. Em contradições explícitas me submeto para conhecer a liberdade e um absurdo sofrimento pavimenta o caminho do absurdo prazer. 

Beijo você para tirar o fôlego, o juízo, a roupa e vou colando em mim sua boca no pescoço, nuca, dorso. Sua língua que anula minha vergonha, inventou essa persona tão aguda que me perfura e se mistura ao ego, ao corpo, à alma. Em você minhas fronteiras se diluem, a desordem de tudo desaparece. E eu finalmente existo.
                                                                                   





MEU BEM - XIII

Olha, meu bem, eu cancelei a festa, as estratégias para segurar um homem, as compras na loja pornô, a lingerie provocante, o champanhe para comemorar mais um ano juntos e a fantasia de nossos amigos de que somos um casal perfeito.  Nesse relacionamento estável o que rolou, meu bem, foi um pêndulo. As vezes era você senhor de si, olhar distante, todo poderoso e eu fingindo que não tinha ciúmes mas metaforicamente curvada a seus pés, tecendo uma corda para trazê-lo de volta, fazendo graças, acrobacias na cama, sorrindo por fora e morrendo por dentro. Passava um tempo e meu olhar brilhava por outro homem e você trocava de papel comigo. Era eu então quem dava as cartas. 
15/12/2014

MEU BEM - XIV

Olha, meu bem, eu disse desde o início que preciso desesperadamente de UM amor, não de vários. E você prefere a diversidade amorosa, um termo mais elegante para galinhagem. Na minha pouca sabedoria para cálculos eu sempre acho que 1 só precisa de + 1, por que 1 precisaria de 2, 3, 4? Desequilíbrio de forças, ninguém dá conta. A gente acha uma delicia ser desejada por tanta gente mas concretizar isso não há corpo nem alma que aguente. Pensa bem, a perfeição está no 2, de onde nasce tudo. Não me basto a mim mesma, preciso do outro, a unidade é solitária e estéril, eu gosto de viver em par, será que é tão difícil assim achar o perfeito? Mas estou errando a palavra porque Desespero vem do Latim desperare (“perder a esperança”, formado por DES-, negativo, mais SPERARE, “ter esperança”, derivado de SPES, “esperança, desejo”) E eu desejo tanto, espero tanto, que seria melhor só pedir Misericórdia, um sentimento de compaixão, despertado pela desgraça ou pela miséria alheia. A expressão misericórdia tem origem latina, é formada pela junção de miserere (ter compaixão), e cordis (coração). "Ter compaixão do coração", significa ter capacidade de sentir aquilo que a outra pessoa sente, aproximar seus sentimentos dos sentimentos de alguém. E assim começo o ano, pedindo a deus e aos ateus, misericórdia. 
05/01/2015




REVÉS - Chiquinha Gonzaga/Ana Terra

Para ouvir acesse

Revés

Não há lugar
na vida  sem o meu amor
pátios, salões,
serestas, bailes, matinés
da Beira-mar à rua do Ouvidor
nas vilas, avenidas,
onde vás eu vou
sem me perder
não há ninguém
nem nada de igual valor
doce afeição,
doidice, drama, servidão
moço que vem
tirar meu chão aos pés
tonteira de licor
te amo de revés
filho, irmão, senhor,
amante que o destino engendrou
bendito seja sempre assim
na semelhança alcança um anjo, um rei
me deixa te embalar até não sei
me leva ao Deus-dará
me faz uma oração
até eu suspirar
e depois reviver


quarta-feira, 13 de agosto de 2014

QUERO MAIS Ângela Ro Ro/Ana Terra

Para o vídeo acesse
http://youtu.be/0DoDOXbVV_4

Quero mais
Uma fatalidade
Um jazz
Um raio me cortando
Um gás
Me embriagando
Faz
Um terremoto em mim
Da guerra quero sim
Só aprender
A paz
Pra que eu não enlouqueça
Me rouba a razão
Pra que eu não adoeça
Me mata de paixão
O amor é ópio
Coração
Quero insana
Mais uma ilusão
Quero sim
Me travestir
de querubim
me enxovalhar
no botequim
numa alegria
enfim
me abandonar
em mim
delírios
sem ter fim
eterno
Tanto faz

sexta-feira, 8 de agosto de 2014

MINHA ARTE






Para ouvir acesse:

Sueli Costa/Ana Terra

Quando é um deserto tudo é treva, luto e dor
eu desespero o amor eterno disse adeus
você me ergue fortalece e sempre faz
da minha queda um belo passo de balé

Se então é festa lavo a alma outra vez
você me enfeita com as estrelas lá do céu
não sei se rei ou se rainha
mas ao chegar tudo ilumina
e nos revela frente e verso as canções

feliz quem toca
seu mistério tudo ensina
e diz que é sorte e diz que é sina
se num dia aventurado te possui
que eu te mereça
te enriqueça faça jus
tocando forte
e docemente os corações
lembrando sempre
eu sou pequena
apenas cresço se me conduz
a toda parte
minha arte
   minha luz

sábado, 2 de agosto de 2014

QUERIA

   Queria ser assim uma alma iluminada
   dessas que não pedem nada
   com minha mão aberta
   e minha humanidade
   prevalecendo sobre minha fera
   Então te amaria incondicionalmente 
   mas meu analista me disse
   que isso não existe
   sempre há condições para amar  
   e eu querendo o absoluto
   fé coragem amor mas não há 

  Queria ser assim uma alma iluminada
  não me doeria nada
  mas eu sei o quanto minto
  meu corpo é puro instinto 
  e mesmo afogando na tua palavra
  não negocia e ainda assim
  quer o teu só pra mim

   Ana Terra/2014